sou daquelas que quando entrevistada pela Marília Gabriela “qual seu estilo musical?” eu responderia “ah Marília, sou eclética, gosto de tudo”. e gosto mesmo. como também sou dessas apaixonada por boas estórias, acredito que tudo na vida tem cheiro e tem trilha musical.
adolescente gravava fita cassete. pra mim mesma. no quarto, sentada na cama e rezando pro locutor da rádio não falar no meio da música. ouvia essas fitas no Walkman amarelo que comprei com dinheiro que ganhei vendendo sanduíche natural no colégio. e vendi sanduíche natural no colégio porque queria comprar um Walkman amarelo. mais tarde troquei o Walkman por um MP3 player e muito depois por um iPod que vivia dentro de um tipo de meinha laranja.
pelo visto também gosto de cores não-discretas não é mesmo?
um dia decidi criar uma playlist no Spotify. não a primeira, mas a primeira com destino certo. tendo em vista que o encontro tinha acontecido em uma pistinha não dava pra ser diferente. depois todas as vezes que a gente se encontrava tinha música no fundo. na grama, na sala, na festa, no restaurante, no carro.
cada conversa vinha com uma referência musical, na caixa de som ou só na minha cabeça mesmo.
daí resolvi juntar tudo e criar uma estória musical, não estava dando mais pra deixar tudo aquilo apenas dentro de mim. começou bem racional, uma música que eu simplesmente gosto e você não por pura implicância. aí veio uma música que você escolheu pra competir com a minha. depois tem uma que você disse que lembrava sobre a gente se encontrando nessa vida. e a estória foi sendo contada desse jeito mas bem ali no meio, entre uma faixa e outra eu (me) perdi. bem no meio da playlist. bem no meio da nossa estória.
de repente já não sabia o que sentir e o que ouvir.
recorri à sabedoria de Arnaldo Antunes e escolhi o silêncio.
um dia apertei o play e aquela estória musical se mostrou tão obviamente caótica que era inacreditável eu não ter percebido antes. letras que diziam mais do que eu queria.
letras que diziam o que eu dizia mas não sentia.
letras que diziam o que eu mesmo não sabia que sentia.
letras que dizem o que você não nunca me disse.
acontece que nenhuma estória – nem aquela trilha sonora – eram de uma pessoa só. tinha um fundo musical que você escolheu para uma piada interna. e ainda está lá uma música que até bem pouco tempo eu acreditava que não teria equilíbrio emocional para ouvir novamente.
ali dentro cabe uma estória inteira, uma vida inteira, um sentir sem fim. título, remake, voz, quem, o que, como, cada acorde, cada pausa…
e a declaração mais linda que já recebi.
acho que você não sabe a dimensão disso.
acho que a gente não entendeu a moral da estória.